São inúmeros os motivos pelos quais mais e mais pessoas buscam um alivio imediato para suas dores. Entre tantas subjetividades, relacionada ao desenvolvimento, cultura, família, círculos sociais, traumas e luto existe um ponto que devemos se atentar: Por que ainda rodeado de pessoas existe a manifestação do ato de extinção orgânica?
Hoje, 90% das pessoas que tentam contra sua própria existência tem perturbações
mentais, 60% destes indivíduos sofrem de depressão, muitas vezes silenciosa em meio a vida,
muitas vezes verbalizada, mas não compreendida. Por que passa despercebido aquele
comportamento de afastamento, aquela palavra negativa, aquele olhar abatido, aquela
necessidade de perfeccionismo?
Será que perdemos a sensibilidade de empatia com o próximo?
Será que nossas necessidades diárias sufocam nossa percepção e acabamos involuntariamente sufocando aos outros e a nós mesmos?
Pergunto: Qual é nossa responsabilidade para aquele que se encontra em um mar de desespero de gritos inaudíveis?
Uma perspectiva de Suicídio
Como reconhecermos em meio a tanta subjetividade um comportamento que caracterize a tendência do ato de extinguir a própria vida?
“Entre mortos e feridos
Entre gritos e gemidos
A mentira e a verdade
A solidão e a cidade
Entre um copo e outro
Da mesma bebida
E entre tantos corpos
Com a mesma ferida”
Humberto Gessinger, 1987
Existem sinais que podem sim nos auxiliar a identificar um comportamento que pode levar ao indivíduo cometer o ato, devemos estar atentos aqueles que nos cercam e aqueles que fazem parte do nosso meio, oscilações e mudanças de humor e comportamento, verbalização negativa e ou inadequada sobre a vida, existe uma gama de fatores, a Organização Mundial da Saúde nos orienta da seguinte maneira:
Embora não haja um “estilo geral” para comunicar intenções suicidas, os sinais de alerta do comportamento suicida incluem: falta
de interesse pelo próprio bem-estar; mudanças em padrões de comportamento social, declínio da produtividade no trabalho ou do sucesso escolar; alterações nos padrões de sono e de alimentação; tentativas de pôr os assuntos pessoais em ordem ou de fazer as
pazes com outros; interesse fora do comum em como os outros se sentem; preocupação com temas de morte e violência; súbita
melhoria no humor depois de um período de depressão; e promiscuidade súbita ou aumentada.
OMS – Genebra 2006
Ao percebermos um comportamento que transpareça o desejo de extinção orgânica devemos agir. Sim, existem indicadores além dos quais foram apresentados, cabe a nós praticar a sensibilidade de perceber a dor do próximo, na maioria das vezes não verbalizada.
A verbalização da ideação do ato é um pedido de socorro, mesmo que involuntário, deve ser tratado com muito respeito, não apresentando dificuldades próprias, crenças e ou questões filosóficas, seja todo ouvidos, a interferência pode criar resistência da parte do
indivíduo podendo levá-lo a se afastar de um provável auxilio, ou dos demais que para ele possivelmente pensem da mesma maneira do sujeito que interferiu, mas fica a questão:
Como lidar com a verbalização de uma ideação suicida?
Monteiro Lobato em seu livro de 1931, descreve que a boneca Emília não falava e Narizinho a leva ao Doutor Caramujo para ser avaliada. O Doutor Caramujo ao diagnosticar oferece uma bala (Pílula):
”Emília engoliu a pílula, muito bem engolida, e começou a falar no mesmo instante. A primeira coisa que disse foi: “Estou com um
horrível gosto de sapo na boca! ” E falou, falou, falou mais de uma hora sem parar. Falou tanto que Narizinho, atordoada, disse ao doutor que era melhor fazê-la vomitar aquela pílula e engolir outra mais fraca.
— Não é preciso — explicou o grande médico. — Ela que fale até cansar.
Depois de algumas horas de falação, sossega e fica como toda gente. Isto é “fala recolhida”, que tem de ser botada para fora”
Monteiro Lobato, 1931
Tamanha sabedoria contida em um texto para crianças, só a verbalização de situações, pensamentos e emoções já tem um ganho terapêutico significativo, o ato de falar e se ouvir já ressignifica muito do discurso apresentado, o ato cuspir o sapo preso na garganta, possibilita um alivio das tensões psicológicas, o indivíduo deve se sentir livre para falar, a escuta silenciosa e pequenas questões bem colocadas garantem uma nova perspectiva de uma situação dolorosa.
Contudo estas pequenas questões devem ser sabias, devemos aos poucos extrair a questão sobre a ideação do possível ato de suicídio, de forma apropriada para situação devemos conduzir a conversa para a verbalização de suas intenções e desesperanças.
De acordo com a OMS esta escala pode nos auxiliar a identificar tal intenção:
Inexistente: Essencialmente, nenhum risco de se fazer mal.
Leve: A ideação suicida é limitada, não há nenhum plano ou
preparação definidos para se fazer mal, e há poucos fatores de risco
conhecidos. A intenção de cometer suicídio não é aparente, mas a
ideação suicida está presente; o indivíduo não tem um plano
concreto e não tentou suicidar-se no passado.
Moderado: São evidentes planos definidos e preparação,
com visível ideação suicida, há possivelmente história de tentativas
anteriores, e pelo menos dois fatores de risco adicionais. Ou, mais
do que um fator de risco para o suicídio está presente, a ideação
suicida assim como a intenção estão presentes, mas é negado que
haja um plano claro; o indivíduo está motivado para melhorar o seu
estado emocional e psicológico atual se houver ocasião para tal.
Severo: Os planos e a preparação para se infligir mal foram
claramente definidos ou a pessoa é reconhecida como alguém que já
tentou múltiplas vezes o suicídio com dois ou mais fatores de risco.
A ideação e a intenção suicida são verbalizadas em conjunto com
um plano bem estudado e com os meios de o levar a cabo. Este
indivíduo demonstra inflexibilidade cognitiva e desesperança
quanto ao futuro e nega o apoio social disponível; houve tentativas
de suicídio anteriores.
Extremo: Um indivíduo que tentou o suicídio múltiplas
vezes com diversos fatores de risco significativos. Atenção e ação
imediata são imprescindíveis.
OMS – Genebra – 2006
Como devemos agir após apresentada a intenção de se ferir ou tirar a própria vida?
“A resposta positiva para cada situação que a vida apresenta é o princípio da superação”
Rafael Henrique Harich – 2020
Cada ser humano é único, sua subjetividade merece respeito, carinho e sensibilidade, ao identificar o grau de sua intenção devemos agir imediatamente para que não tenhamos um prognostico desfavorável.
No primeiro item um da escala, o risco de suicídio é inexistente, mas se questione:
Quais foram os reais motivos de uma conversa tão íntima?
Qual necessidade estava tentando ser suprida? O ato de extinção orgânica não surge do dia para noite é construído nas entrelinhas de um texto extenso.
Em uma intenção leve ainda não se concretizou a ideação do ato, mas se inicia um processo que deve ser tratado com cautela, acompanhe com carinho e atenção as necessidades e faça perceber em si que existem outras formas de lidar com a mesma situação, o mesmo deve ser reavaliado.
Em uma situação moderada, devemos dar os meios para que o mesmo se reestabeleça como sujeito, a comunicação com próximos de seu círculo social deve ser feita, uma avaliação e um tratamento mais estratégico e minucioso deve ser colocado em pratica.
No quadro severo e grave, devemos agir imediatamente, a internação involuntária deve ser tida como um recurso, a avaliação psiquiátrica e o uso de psicotrópicos devem ser estabelecidos, acompanhamento terapêutico é essencial para que o indivíduo alivie suas dores e desenvolva uma nova perspectiva de vida.
Olhando no espelho
Quando eu olho o meu olho além do espelho
Tem alguém que me olha e não sou eu
Vive dentro do meu olho vermelho
É o olhar de meu pai que já morreu
O meu olho parece um aparelho
De quem sempre me olhou e protegeu
Assim como meu olho dá conselho
Quando eu olho no olhar de um filho meu
João Nogueira – 1992
Não podemos dar aquilo que não temos, mas em nossa história nossa experiência de vida temos uma riqueza de inestimável valor, olhe profundamente e com sensibilidade para aquilo que lhe foi apresentado como vida, tamanho valor há em suas lembranças e em seus pensamentos, eu quero levantar uma questão existencial aqui, será mesmo que reconhecemos o amor que temos para conosco?
Vou utilizar como base uma perspectiva de amor entre tantos conceitos e interpretações, vamos pensar no amor como: “O ato de desejar que alguém seja feliz”
Partindo deste ponto vamos pensar que este “Alguém” sejamos nós, qual é seu ato de desejo para seu próprio bem-estar? Ao lermos os textos acima será que deixamos passar batido a responsabilidade que nós temos conosco, aquele pensamento repetitivo, aquelas piadas que desvalorizam nossa existência, aquele sentimento de angustia calado em nosso peito, todos nós temos a necessidade de falar de nossas dores, um ato de amor para conosco seria sentar com outro alguém que se preparou para nos orientar e nos fazer perceber os quão valiosos somos. Para todas essas situações que a vida nos apresenta saiba que alguém já enfrentou o momento que estamos passando.
Eu desejo que levem estas palavras para toda a vida, quando a resposta não está em nós, ela está em outras pessoas, o círculo social é de extrema importância para nosso desenvolvimento e amadurecimento, escolha bem para quem falar suas intimidades e esteja disposto a respeitar e não necessariamente acatar a opinião alheia, carregue com você somente aquilo que lhe dá resultado.
Conclusão
Os comportamentos voltados a autodestruição não têm de passar despercebidos, foram apresentadas ferramentas e formas de lhe dar com a situação, é nossa responsabilidade cuidar do bem-estar de nosso círculo social, não vivemos no cada um por si, parte de nós
identificar e tomar as medidas para que não se sufoquemos e não deixemos sufocar.
A dor do próximo é ensinamento para ele e para nós, não privemos a nossa existência do aprendizado da dor, compreenda a necessidade do próximo sem críticas ou julgamentos, até mesmo um insulto pode ser um grito de socorro, com sabedoria e mansidão direcione para estrada aquele que está fora do caminho.
Trabalhemos juntos para que em nossa história não ajam gritos inaudíveis, que toda dor seja verbalizada, tratada e acompanhada, com respeito carinho e sabedoria, a vida é responsabilidade de todos.
Rafael Henrique Harich 17/09/20 02:51
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