Historias de sucesso

Eu poderia ter passado o resto da minha vida exatamente ali, esparramada na autopiedade. Lustrando as lembranças difíceis com zelo de quem guarda relíquias. Fazendo contas para medir o amor que ofereci e o amor recebi. Atualizando todo dia a estatística das perdas e insucessos vividos. Esmiuçando, incansável, a história de cada traição sofrida. Envenenando-me com a substância tóxica da culpa. Morrendo de fome, com recursos para banquete, o medo desmatando lentamente territórios arborizados da alma, secando rios de delícias, amordaçando passarinhos, desmentindo flores. Onde não corria vento, onde não batia sol, onde toda muda de alegria morria desidratada, onde só brotava pé de mágoa. Poderia, não porque ali fosse lugar aprazível, mas porque ali me parecia seguro. As insatisfações organizadamente acomodadas, os culpados escolhidos, as desculpas em dia, a escuta blindada para não ver o quanto o cansaço de toda aquela insipidez embotava os meus passos desmanchava estrelas. Esgarçava devagarinho o frágil tecido da paz. Ali, era mais fácil não arriscar movimento. Ali, era mais fácil esquecer que podia fazer escolhas. Ali, era mais fácil esquecer-me. Mas a alma, sábia e habilidosa bordadeira de pretextos, quando encontrou brecha, arrumou um jeito de iluminar aquele lugar. Foi então que eu conheci o Rafael Henrique Harich, que me acolheu meu ouviu e ainda me ouve com muito carinho e respeito, com a terapia estou conseguindo enxergar exatamente onde estava com nitidez reveladora e também desconcertante. Fazia tempo,que eu desconhecia o paradeiro do brilho dos meus olhos sem ter feito nenhum movimento para trazê-lo de volta. Estava profundamente infeliz e agi durante temporadas como se isso não me dissesse respeito. Não fazia ideia da vez mais recente em que eu experimentei satisfação autêntica e até aquele momento eu sequer havia notado. Dei tanto poder aos outros para interferirem na minha alegria que esvaziara o próprio até a exaustão. Afastei tanto do coração e do meu desejo que diante de cada golpe sofrido sem contar com a minha própria proteção. Esforçei-me de tal forma para cuidar dos outros e não cuidei de mim mesma. Os sucessivos desapontamentos tentaram me dizer que eu não era merecedora de coisas que faziam toda diferença, e eu acreditei. Na clareza que o Rafael me traz nas terapias me liberta cada dia mais, ao lembrar que sou capaz de fazer escolhas pela minha própria vida, escolhi sair daquele lugar, passo a passo, gentileza a gentileza, sessão de terapia a sessão de terapia, no tempo que for necessário. Agora, posso contar de novo comigo mesma. Renovar, gesto a gesto, o compromisso com o meu próprio coração. Sentir-me responsável pela minha própria felicidade com a confiança de quem recorda o que realmente mais me importa. E com uma vontade toda nova de, primeiro, desfrutar a dádiva da própria lindeza e do próprio amor. Às vezes o coração, rasgado pela dor, vira retalho. Recomenda-se, nestes casos, costurá-lo com uma linha chamada recomeço. É o suficiente.